Prof. Chafic Jbeili – www.chafic.com.br
Havia uma jovem que trabalhava em um gabinete ao lado onde eu fui assessor parlamentar há alguns anos. A moça tinha uns 25 anos, aproximadamente. Esbaldava ótima apresentação vestual e sua expressão era sempre a de alguém em paz com a vida. Certo dia, fui além do bom dia e boa tarde e a elogiei: “Você se veste muito bem!”. Ela não demorou muito e respondeu: “Ah, que nada! Esta roupa já está batida, comprei há anos...” e continuou depreciando seus trajes da cabeça aos pés, até que sem graça e decepcionado, sai de perto e fui embora engasgado sem entender bem o que havia acontecido.
Dias depois , em outra oportunidade de corredor, soltei-lhe um chiste: “Como uma moça tão bonita e bem arrumada desperdiça um elogio tão despretensioso e sincero assim?”, mas ela respondeu se defendendo e dizendo que não jogou o elogio fora, apenas havia sido franca em dizer sobre as roupas dela e que afinal não se achava tão bonita assim.
Bem, quando elogio ela recusa e começa a se depreciar, quando aponto um defeito e digo que ela não aceita um elogio, então nega. Como se vê, ela padece de autoaceitação, este segundo pilar da autoestima. Acontece que para ela usufruir autoaceitação precisa antes tomar a atitude de viver conscientemente. Veja como o segundo pilar depende do primeiro!
A idéia do Dr. Nathaniel Branden nominar de “pilares” as dimensões da autoestima é bastante oportuna e pertinente, pois assim como um ed ifício não pode se sustentar sem qualquer um de seus pilares, da mesma forma a autoestima não pode existir em uma condição saudável sem qualquer um de seus pilares, em especial este segundo, considerado mais central do que os demais, embora todos sejam ou estejam intensamente interligados e dinâmicos entre si.
A atitude da autoaceitação é o segundo pilar da autoestima e o Dr. Branden afirma que “[...] a não aceitação de si mesmo é a recusa em manter relacionamento antagônico consigo mesmo”. Desta forma, a título de exemplo, a criança que cresce ouvindo adjetivos depreciativos sobre si, desconfiará de qualquer elogio no futuro, pois o que o outro diz a seu respeito contradiz a autoimagem registrada em seu cérebro e, por isto, não aceita. O contrário também é verdadeiro: A criança muito mima da e paparicada terá maior dificuldade aceitar seus defeitos quando adulta.
A atitude de autoaceitar é estar do próprio lado e agir a favor ou em favor de si mesmo, resguardadas as devidas proporções. Especialistas em saúde mental concordam que tanto o cliente em tratamento psicoterápico quanto o aluno em sala de aula poderão apresentar maior dificuldades em assimilar adequadamente um novo aprendizado se, eventualmente, a recusa em aceitar a si próprio for intensa e profunda.
Esta afirmativa faz sentido, na medida em que a pessoa que não se aceita, rejeita inconscientemente qualquer melhora ou crescimento mais significativo, podendo inclusive boicotar-se simplesmente por não saber colocar-se do próprio lado e agir em favor de si mesmo. Neste caso, não se deve confundir com o egoísmo, pois enquanto no agir em favor de si mesmo é aceitar a porç& atilde;o que lhe é devida, no egoísmo a pessoa não quererá compartilhá-la, o que é bem diferente.
Observe que muitos clientes de psicoterapia abandonam o tratamento justamente quando estão começando a sentir algum progresso mais substancial. Esta dinâmica pode ser, entre outras coisas, indícios de autosabotagem em função do despreparo em relação à atitude da autoaceitação.
Invariavelmente, o não desenvolvimento ou a degradação do segundo pilar da autoestima faz com que a pessoa nutra desde intolerância até ódio por si mesmo, podendo chegar a níveis mais preocupantes e desencadear atitudes de autoagressões, autopunições, automutilações e até mesmo a renúncia direta ou indireta pelo desejo de viver.
O caminho da restauraç&atil de;o deste importante pilar da autoestima é empreender ações que visam despertar na pessoa pensamentos, palavras e atitudes de autoafirmação. é preciso que a própria pessoa consiga repetir em voz alta que respeita a si mesma; que tem valor e que tem o direito de ser quem ela é. Mais uma vez, estas ações não devem servir para fazer com que a pessoa fique estagnada em uma determinada condição, mas que possa reconhecer e aceitar tal condição como ponto imediato de partida para uma situação ou condição mais elaborada.
Não é o fato de uma pessoa mal educada, social e moralmente inconveniente declarar-se deste jeito e fazer com que o outro a aceite assim. Mas é o caso dela mesma avaliar a impertinência desta sua condição e decidir-se evoluir em termos de maior produtividade e melhor qualidade de vid a social. Para cada lugar existente e de acesso disponível há um comportamento mínimo esperado. Para cada relacionamento, independentemente dos níveis de interação, há uma reciprocidade mínima esperada. Tanto nos lugares quanto na presença de outras pessoas, qualquer um pode continuar sendo quem ele é, mas de um jeito mais condizente e harmonioso. Infelizmente, muitas pessoas têm tido maior facilidade em trocar de personalidade do que mudar de atitudes.
é pela autoaceitação que estas nuanças poderão ser melhor percebidas e mais adequadamente trabalhadas. O simples fato de alguém ter a coragem de pedir e buscar ajuda é um ótimo sinal de autoaceitação. Lembra do ditado popular? “O pior doente é aquele que não reconhece a doença”. Quem não reconhece a doença, dificilmente pedir á ajuda. Porém, a glória da restauração e desenvolvimento do segundo pilar da autoestima se efetiva quando uma pessoa que passou boa parte de sua vida se sujeitando a humilhações e abusos de toda natureza resolve dar um basta nesta condição e diz para si mesma: “Agora chega!”. Esta declaração é um marco histórico na evolução de sua situação.
é preciso operar em favor de si mesmo quando ninguém mais pode fazê-lo, agindo positivamente e decidindo mudar uma situação indesejada, nem tanto por causa da submissão em si, pois esta tem seus limites aceitáveis, mas certamente por causa da mínima e qualquer condição de subjugação. Esta deve ser inaceitável!
Em seu livro “Sentido e contra-senso da revolta”, Julia Kristeva destaca os a spectos positivos e extremamente necessários da revolta. Tida como algo pejorativo e antisocial, a revolta, quando utilizada e aplicada em determinadas situações é altamente indicada. Afinal, apesar de óbvio ninguém deveria aceitar para si o que é inaceitável para qualquer um.
A atitude de autoaceitação é para pensamentos, características pessoais e demais coisas que são de modo geral aceitáveis, de modo geral. De outra forma, é preciso lançar mão da revolta inteligente e determinar a mudança, decidindo-se posicionar do próprio lado e em favor de si mesmo. Este é o contra senso da revolta! Dizer “chega!” à humilhação, ao abuso e à subjugação.
Quando eu digo sobre aceitar as coisas aceitáveis, estou me referindo, por exemplo, a recusa de algué m em olhar-se no espelho só porque não aceita suas medidas, a cor de sua pele, o formato do cabelo, o tamanho do pé ou coisas deste tipo, mas indubitavelmente é preciso aceitar cada imperfeição como sendo particularmente sua. Isto não quer dizer, repito, que aceitar-se seja conformar-se. A partir da aceitação é que a mudança poderá ser empreendida.
Para que haja mudança e crescimento é preciso que haja autoaceitação. Aceitar-se a si próprio é estagnar-se na condição ou situação atual, mas reconhecer que tal condição ou situação é um ótimo ponto de partida para a condição ou situação que se deseja alcançar.
Quando a pessoa resiste reconhecer em si os próprios defeitos ou a enfrentar a fonte de seus dissabores vivenciais , então a angústia se fortalece e a ansiedade tende aumentar. Entretanto, quando esta pessoa identifica e reconhece, aceitando, suas imperfeições e decide enfrentar aquilo que ela teme, permitindo e incentivando aflorar à consciência o que estava latente, então, a idéia adoecedora, que antes era forte se enfraquece e se dissolve naturalmente.
A atitude da autoaceitação começa quando a pessoa reconhece em si a antagônica condição humana, posto que é imperfeita apesar de fascinante; ignorante apesar de estudada; aprendente apesar de docente; confiante apesar de traída; cansada apesar de determinada; ingênua apesar de inteligente; errante apesar de assertiva, enfim, todos somos tudo e também somos nada. é a atitude da pessoa que dirá quem ela é, apesar do tempo, do lugar, das pessoas e das circunstâncias.
Só não quer se conhecer quem não se aceita. Quem não se aceita e, por isto, recusa saber quem é, então, variavelmente acabará sendo quem os outros dizem que é e, assim, acabará se conhecendo pelo outro e não por si mesma, o que seria muito mais prazeroso, verídico e adequado. Se uma pessoa demonstra ainda não conseguir conviver com seus próprios defeitos e imperfeições, estimule-a a aceitar pelo menos as próprias qualidades, para que não fique total e aleatoriamente à mercê da opinião dos outros e, por consequência, estabeleça imagem mental de si mesma, bem diferente da própria realidade, estruturada essencialmente em determinações alheias.
Encerro esta crônica com uma reflexão assinada por Mark Twain “[...] Daqui a alguns anos você estará mais arrepend ido pelas coisas que não fez do que pelas que fez. Então solte suas amarras. Afaste-se do porto seguro. Agarre o vento em suas velas. Explore. Sonhe. Descubra”.
Na próxima segunda escreverei sobre o terceiro pilar da autoestima: a auto-responsabilidade.
Um abraço,
Prof. Chafic
Amor eterno
Há 10 anos
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